Os primeiros cristãos não continuaram as pregações de Jesus, mas começaram a proclamar o próprio Jesus. Isso é evidente nas epístolas que Paulo escreve para as primeiras igrejas cristãs, apenas vinte ou trinta anos depois da morte de Jesus.
Jesus tinha proclamado o evangelho (“a boa nova”) do reino de Deus. Portanto, a boa nova do que Jesus proclama é que o reino de Deus está próximo. Tanto nos Atos dos Apóstolos como nas cartas do Novo Testamento, o evangelho permanece uma palavra-chave; porém, nessas alturas, ela assumiu um novo significado. Agora a boa nova é o Cristo ressuscitado. O evangelho é a própria “experiência de Cristo”, a saber, que Deus enviou seu filho por amor ao ser humano. O que se destaca é Jesus como salvador e o que isso representa para o homem.
Essa mudança de ênfase não implica nenhuma quebra nos ensinamentos de Jesus nem em sua visão de si mesmo e de seu papel. Jesus também via seus ensinamentos como inseparáveis de sua própria pessoa.
Nos mais antigos ensinamentos cristãos, Jesus é o Deus vivo que conquistou a morte e que em breve irá voltar para julgar os vivos e os mortos. Os seguidores de Cristo não viviam apenas com a lembrança do Cristo terreno — ou “o homem de Nazaré”; viviam sabendo que estavam em comunhão com ele. O ponto crucial é crer em Jesus como Senhor e salvador.
O credo cristão
Embora o Novo Testamento inteiro seja um testemunho cristão, durante os primeiros séculos após a morte de Cristo surgiu a necessidade de formular um credo mais definido. Isso aconteceu, entre outras razões, porque naquela época havia uma considerável mistura religiosa (sincretismo).
Para evitar que o cristianismo ficasse aprisionado nessa religiosidade híbrida, era crucial para a Igreja determinar os princípios centrais da fé cristã. Esse esclarecimento também era necessário para prevenir cisões internas entre as igrejas locais e comunidades cristãs. Um resumo dos pontos essenciais da fé se fazia necessário na instrução que a Igreja dava antes do batismo.
Foi assim que passaram a existir os dogmas. A palavra dogma significa “doutrina”, e um dogma cristão estabelece o que é o ensinamento cristão correto. Gradualmente, os dogmas foram incorporados a credos mais longos. O mais antigo desses credos cristãos é o Credo dos Apóstolos, que em sua forma inicial data da Igreja de Roma, século III de nossa era. Mais tarde o dogma cristão também foi formulado no Credo do Concilio de Nicéia (século IV) e no Credo de Santo Atanásio (século v). Apesar de haver variações na adoção de credos na Igreja primitiva, o Credo de Nicéia é utilizado por todas as principais igrejas cristãs.
O dogma sobre Jesus afirma que ele era Deus e homem. Assim, Cristo não é apenas filho de Deus; ele é o próprio Deus.
Como era possível que “o homem de Nazaré” fosse Deus? Esse foi o ponto central discutido durante as disputas dogmáticas dos primeiros séculos do cristianismo.
O fato de que Jesus era um homem é claramente ilustrado nas descrições que temos dele nos quatro evangelhos. Aí podemos ler sobre toda uma gama de emoções humanas. Jesus era capaz de sentir alegria e tristeza; podia ser terno e compassivo, mas também severo e reprovador. Ele sofria tentações como qualquer outro ser humano e durante suas últimas horas de vida travou uma batalha interna contra o medo da morte. Essa batalha foi tão árdua que lhe trouxe o mais profundo desespero por ter sido abandonado por Deus.
Por outro lado, Jesus expressou a unidade entre Deus e ele em várias ocasiões. “Eu e o pai somos um”, disse ele (João 10,30), e “Quem me vê, vê o Pai” (João 14,9). No início de seu evangelho (1,14), João afirma: “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós”, o que significa que Deus se tornou homem. A teologia cristã chama a isso de encarnação (assumir a carne humana, um corpo).
Um ponto muito discutido na Igreja dos primeiros séculos foi exatamente como compreender e explicar a encarnação. Algumas pessoas destacavam o lado humano de Jesus; outras, o lado divino.
Cada um desses pontos de vista se esquiva de um dos princípios fundamentais do cristianismo, isto é, que Deus se tornou homem. Jesus não era uma pessoa dupla, mas “verdadeiro Deus e verdadeiro homem” ao mesmo tempo.