A Bíblia descreve Deus não apenas por suas ações (como criador e salvador), mas também com palavras que ilustram certas características principais da “imagem divina”. Tais palavras são tomadas de nossa esfera imaginativa para descrever “aquilo que não é deste mundo”.
(Aparição de nosso Senhor Jesus Cristo] que mostrará nos tempos estabelecidos.
o Bendito e único Soberano,
o Rei dos reis e Senhor dos senhores,
o único que possui a imortalidade,
que habita uma luz inacessível,
que nenhum homem viu, nem pode ver.
A ele, honra e poder eterno! Amém!
Primeira Epístola de Paulo a Timóteo, 6,15-16
Para compreender essas expressões, muitas vezes precisamos nos reportar à época em que elas foram cunhadas. Por exemplo, considerando uma expressão aparentemente direta como “Deus é nosso pai”, podemos ver que a interpretação deve levar em conta as condições históricas nas diferentes épocas em que a Bíblia foi escrita. O termo pai não tem absolutamente nada a ver com nossa idéia moderna dos papéis sexuais. “Pai”, conforme a posição dos pais de família naquela época, significa alguém que ama seus filhos mas que também exerce autoridade e espera deles obediência. A Bíblia está nos dizendo que o amor de Deus é ilimitado em sua bondade e absoluto em suas exigências.
O Deus do amor
O principal comentário da Bíblia acerca de Deus é que ele é “amor”. Essa não é uma descrição de uma entre outras características de Deus, mas uma sua qualificação geral. Tudo o que a fé cristã pode dizer a respeito de Deus são variações em torno desse grande tema. A Bíblia também destaca que é impossível para o ser humano conhecer a Deus ou amar a Deus se não nos amamos uns aos outros. Pois Deus é amor.
Todos nós sabemos que a palavra amor tem conotações distintas. Para compreender o que a Bíblia está afirmando quando diz que Deus é amor, pode ser útil saber qual o uso dessa expressão na língua original do Novo Testamento, o grego. Em grego há duas palavras que podem ser traduzidas pela palavra amor: eros e ágape. Eros pode ser traduzido como “querer” ou “desejar”. O filósofo grego Platão (c. 400 a. C.) usa a palavra eros ao falar do desejo que o homem tem da beleza, da excelência, do conhecimento e da eternidade. Para Platão, eros era um anseio inerente à humanidade. Ele expressa a origem elevada da alma, manifestando-se nos seres humanos como uma necessidade irresistível de partir em jornada rumo à pátria celestial. Eros é o anseio que sente o homem, esse ser transitório, pela eternidade. Podemos dizer que essa palavra descreve o amor que o homem tem pelas coisas que vale a pena amar, ou seja, pelas coisas valiosas. (Hoje em dia as palavras eros e erótico são usadas com um sentido mais restrito do que na filosofia platônica, isto é, no sentido do amor sexual.)
De certa forma, a palavra ágape significa quase o oposto de eros. No Novo Testamento, a palavra é usada para designar o amor misericordioso e devotado de Deus pelo ser humano. Pois o amor de Deus é espontâneo e se auto sacrifica sem pensar se a humanidade o “merece”. Ele não emana da carência, mas da abundância, e também é dado em abundância àqueles que não merecem amor nem são dignos de amor. Nesse contexto, o amor de Deus é um modelo para a caridade cristã. Os primeiros cristãos usavam a palavra ágape para designar suas refeições comunitárias, que terminavam numa comunhão. Poucas passagens na Bíblia ilustram tão bem a compaixão de Deus pelo homem e seu amor repleto de perdão como a parábola do “Filho pródigo”.
O Deus eterno e sagrado
Várias passagens na Bíblia indicam que Deus existe “desde sempre e para sempre”. Ele existia antes que o mundo fosse criado e permanecerá sempre o mesmo. “
Quando Moisés perguntou o que deveria dizer quando lhe perguntassem quem o enviara ao Egito para libertar os hebreus da escravidão, Deus lhe deu esta resposta: “‘Eu sou aquele que é.’ Disse mais: ‘Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me enviou até vós'”(Êxodo 3,14). Em outra passagem do livro final da Bíblia cristã: “Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim” (Apocalipse 21,6).
Ambos os textos enfatizam que Deus transcende as noções comuns de tempo e espaço. Diferentemente do homem, que é sujeito à temporalidade e à morte, ele é imutável e eterno.
Ele não é uma parte do universo como as estrelas, as flores e os animais. Ele se situa acima do mundo e dos processos que aqui ocorrem — como seu criador e governante.
A Bíblia afirma que Deus, diferentemente do homem e do universo, é o Santo. E qualquer palavra que designe o sagrado, qualquer palavra que conote a esfera divina, é uma palavra-chave em qualquer religião.

Outras definições de Deus no Cristianismo
A Bíblia oferece outras definições de Deus: ele é pai, Senhor, todo-poderoso, onisciente, bom, misericordioso, justo e pessoal. Por trás de cada uma dessas diversas características há sempre um acontecimento, porque o Deus cristão é algo mais que um princípio filosófico. Ele é um ser pessoal que ouve as orações e os louvores do homem. Ele é o Deus da história, que guia o mundo rumo ao objetivo que ele determinou: o reino de Deus.
Não se pode encontrar na Bíblia nenhuma doutrina sistemática a respeito da essência e das características de Deus. Muitos cristãos diriam que a mais importante descrição de Deus se encontra na pessoa de Jesus Cristo e em suas pregações. E comum dizer que não se pode distinguir a crença cristã em Deus da crença em Jesus. Desde a Idade Média, costuma-se afirmar que o homem pode se aproximar de Deus de duas maneiras diferentes: por meio do pensamento ou por meio da fé. Por exemplo, Martinho Lutero acreditava que é possível para nós conceber uma onipotência que criou o mundo, sem referência à Bíblia. Porém, a natureza dessa força permanece oculta para nós. Para os cristãos, tudo o que se sabe com certeza a respeito de Deus é aquilo que Jesus revelou em sua vida e em suas prédicas.
A teologia católica distingue entre uma revelação natural e outra sobrenatural. A revelação natural significa a percepção divina que é acessível a todos os seres humanos, pois Deus se revelou no mundo natural e no anseio religioso do homem. A revelação sobrenatural é a revelação especificamente cristã.
Portanto, ao observar o mundo que Deus criou — e usando nossa razão —, não podemos adquirir mais do que um conhecimento indireto de Deus. A compreensão perfeita vem apenas do nosso encontro de fé com Cristo.